domingo, 15 de fevereiro de 2009

Capítulo 33: _Eu sei de tudo Anne Marrie.

Noite feliz.

O natal chegou e até que enfim! Depois de um mês de preparativos, decorações, concursos e neve artificial, os céus do Moinho receberam a noite encantada de natal. Sem exageros.

Com Louísa longe do condomínio a noite feliz estava realmente garantida. Ela e a família foram passar o feriado no Rio de Janeiro e segundo as palavras de Theodor, Louísa ia ficar por lá, mesmo depois do natal e do ano novo, para se tratar psicologicamente sob os olhos atentos da avó, que era bem severa.

Anne não podia estar mais feliz, ela estava super animada com a ceia na casa do namorado Rafael, ela preparava uma ceia na casa dela também por conta da irmã, o cunhado e a sobrinha que vieram passar o natal com ela no sul junto com Olivier e Juca. Anne estava nervosa com relação ao presente que ia dar a Rafael, ela já havia preparado tudo com cuidado, o lugar era perfeito e ela tinha bastante esperança que ele ficasse mega feliz com o regalo especial. O escândalo que Louísa aprontou na festa do concurso, acabou por revelar a todos o segredo que Olivier escondia desde que havia chegado a Rosa Velha, sem opções ele abriu o jogo com seus amigos, que o reprimiram, mas não pelo fato dele ser gay e sim pelo fato de ele ter escondido isso tanto tempo com receio da reação deles. Mas tudo acabou em risadas e brincadeiras. Juca que não ficou muito feliz por todos agora estarem sabendo do namoro dele com Olivier, ele era duro com a verdade, chegou a discutir com Olivier sobre isso:

_Ela falou que VOCÊ era gay, não eu. _Disse Juca nervoso. _Você não precisava dizer que nós somos namorados.

_Mas Juca que mal tem isso? Porque esconder isso por mais tempo? Eles iam acabar descobrindo mais cedo ou mais tarde. _Disse Olivier.

_Mas era um direito meu, é sobre minha vida, sobre mim, não sobre o que seus amigos idiotas pensam ou acham. Eu tô me lixando pra eles. _Disse Juca.

_Calma Juca, tá tudo bem, ninguém vai falar nada, nem te desrespeitar. _Disse Olivier.

_Eu só não quero voltar mais lá na tua casa. Não vou suportar ser olhado como diferente dos outros. _Disse Juca. _Nem quero voltar naquele Moinho.Todo mundo que mora lá estava lá aquele dia na festa. Seus amigos podem até ser liberais e cabeça aberta, mas não duvido que assim que eu chegar lá eles vão ficar falando pelos cantos sobre mim. _Disse Juca envergonhado e irritado.

_Você é diferente sim e daí, ninguém tem nada haver com isso. _Disse Olivier. _O que importa são as pessoas que se importam com você, o resto é resto.

_Eu não gosto Oli, só isso, dava pra respeitar? _Disse Juca roxo de raiva. _Eu não quero ser a aberração, quero ser normal. Não suporto indiferença. Eu já sou pobre, se souberem que eu sou gay, tudo só piora.

_Não fala isso. _Disse Olivier.

_É porque tu é rico, agora quero ver quando meus pais souberem e me colocarem na rua o que eu vou fazer. _Disse Juca. _Você foi fácil. Mudou pra outro estado e tem uma casa só pra você.

_Qualquer coisa você vai morar comigo. Mas fica tranqüilo que seus pais não vão saber de nada, fica calmo. _Disse Olivier esboçando um sorriso. _Eu falei pra eles que era segredo.

_Mas na sua vida não tem segredo, você está sempre na imprensa, e aquela menina gritou pra quem quisesse ouvir. _Disse Juca. _Eu sabia que isso ia acontecer, eu sou um idiota. Agora se meus pais souberem disso pelos jornais, revistas, ou seja lá quem quiser contar alguma coisa a respeito da gente. O que eu vou fazer?

_Já disse: Você vai morar comigo e com minha tia. _Disse Olivier sorrindo.

_Sua tia não gosta de mim. _Disse Juca.

_Pra falar a verdade, nenhum deles gostou de você lá. _Disse Olivier.

_E tu acha que eu não sei? Eu vi a cara deles aquele dia, sei bem o que eles devem ter andado falando de mim. _Disse Juca. _Por isso que eu não queria que ninguém soubesse que eu sou gay, muito menos que eu sou seu namorado.

_Pára Juca, não é por isso que eles não gostaram de você. _Disse Olivier. _ É pelo seu jeitão, sempre na defensiva, encrenqueiro, briguento, irônico, sarcástico. É por isso. Mesmo porque, antes eles não sabiam de nada e já não gostavam de você.

_E tu quer realmente que eu volte lá? _Disse Juca na portão da sua nova casa que ficava a poucos minutos do condomínio onde Olivier morava.

_Ainda dá tempo de mudar isso Juca. _Disse Olivier. _O teu problema, é que você é desse jeito porque tem medo que alguém perceba que você é gay. Não precisa mais se preocupar com isso, eles já sabem de tudo, pode se jogar agora.

_Eu não me jogo, porra nenhuma! Isso é coisa sua. _Disse Juca. _Eu sou homem.

_Que gosta de outros homens, qual o problema? Isso não diminui sua masculinidade. _Disse Olivier.

_Mas diminui a sua. _Disse Juca já sorrindo.

_Eu sou afeminado? _Perguntou Olivier.

_Nem é. Mas é menos macho do que eu. Artista né? É normal ser assim mesmo, sensível. Mas isso não tem nada haver com o fato de você ser gay, é só porque você é artista, qualquer artista é assim mesmo, sensível.

Os dois riram.

Por fim Juca aceitou voltar ao Moinho, com a condição de que ninguém fizesse piadinhas nem brincadeiras de mau gosto. Olivier prometeu uma segunda vez, e disse que já tinha avisado a todos, e por todos da turma já conhecerem o gênio ruim de Juca, eles aceitaram as condições. Somente Rafael disse que não ia ficar pensando no que dizer, pensando muito, com medo de magoar o namorado do amigo.

Patrícia não estava mais andando com o irmão e seus antigos amigos. Depois daquela noite ela resolveu se afastar de todos. Estava envergonhada por ter sido enganada por Louísa. Ela agora era da turma da rua de cima, a turma do André. Que péssimo! Nem ela gostava de ficar lá, ela não sorria mais, se fazia de divertida entre eles e principalmente quando alguém da turma do João a via de longe. Ela queria mostrar que estava bem sem eles. João estava preocupado com a irmã, mas não tinha muita coisa com o que ele pudesse fazer, ele só era rígido quanto ao horário que ela deveria voltar para casa e sempre pedia informação de onde ela ia com André e os outros. Marina e Roberto estavam mais que aflitos, estavam desesperados, o que poderiam ter feito era prender a filha no quarto como Theodor fazia com Louísa, mas eles eram totalmente avessos a isso, força bruta jamais seria usada. Ao invés disso, eles preveriam a conversa. Passou a ser rotina na casa dos Pinho Medeiros as reuniões de família, mas Patrícia estava relutante a mudanças no seu novo estilo de vida, ela não aceitava opiniões e muito menos conselhos.

_Filha! Tu vai passar a noite conosco hoje? _Perguntou Marina esperançosa logo de manhã quando Patrícia ia deixando a mansão.

_Não sei mãe. _Disse Patrícia friamente enquanto ia direto para saída.

_Eu vou mandar prepararem a rabanada que tu tanto gosta hoje à noite. _Disse Marina olhando com olhos suplicantes para Patrícia.

Patrícia parou como uma estátua e sentiu na voz da mãe uma leve melancolia. Ela tinha consciência de que estava deixando triste com seu afastamento. Patrícia estava travando uma batalha com sigo mesma, pesando coisas, revendo conceitos, não externos, ela estava fazendo uma faxina dentro de si mesma, e isso a confundia, colocava em testes seus sentimentos, seus amores, suas prioridades, sua vida. Ela só estava confusa, mas não menos triste que ninguém. Ela estava derrotada, acabada, machucada e precisava se recuperar de alguma forma, e ver a todo tempo Olivier não iria ajudar muito. E pra isso ela achava que deveria se afastar de novo do seu irmão e de todos seus amigos, como já tinha feito. Ela agora recorria a André porque não tinha mais ninguém, ficar sozinha seria dar chance a uma grande depressão e isso ela não queria, não agora. Só iria piorar as coisas. Então:

_Eu venho mãe. _Disse Patrícia antes de sair correndo pela porta, antes que começasse a corar.

Marina conteve as lágrimas antes que elas rolassem e abriu um grande sorriso por ter conquistado a filha, pelo menos por aquela noite.

Piedra estava super ansiosa para esse natal, o motivo? Seu pai Ralf Schreisen iria passar o natal com ela e a mãe, João também iria participar da ceia deles. O pai de Piedra sempre foi muito ausente, pouco ela e a mãe falavam dele, para evitar sentirem saudades. As duas o amavam muito, acima de tudo e de todos. Ele sabia disso para tirar proveito de muitas coisas. Ele trabalhava no meio agropecuário e usava isso como desculpa para suas longas e constantes viagens de negócio.

_Anne? _Disse Piedra ao celular.

_Hei Pi! _Disse Anne animada.

_E aí, tudo pronto pra surpresa do Rafa? _Perguntou Piedra excitada ao falar.

_Está tudo pronto sim, só eu que não estou. _Disse Anne.

_Como assim Marrie? _Disse Piedra revoltada.

_Eu só estive com um homem na minha vida, e logo já engravidei. Um ano depois eu perdi meu filho e matei o único homem que eu realmente amei na vida. O que você espera de mim agora? Que eu acha como se isso fosse fácil pra mim? Não é tão simples assim. _Disse Anne.

_Bá! Tu tem medo de quê guria? _Perguntou Piedra.

_De mim. _Disse Anne. _Eu tenho medo do que eu possa começar a sentir pelo Rafael a partir de hoje.

_Como assim? _Perguntou Piedra confusa.

_E se tudo que eu senti pelo Humberto, que me levou a fazer tantas coisas loucas, a ficar doente de amor como dizem né. E se tudo isso começou depois que eu dormi com ele? _Disse Anne aflita.

_Acho que não Anne. Tu tem que se esquecer do Humberto, pelo menos por alguns minutos. Cada homem é um homem, nenhum é igual ao outro. _Disse Piedra. _Não estou duvidando do teu amor pelo Rafa, mas sei que tu ama ele de um jeito diferente, mas ama. O sexo só vai vir pra aumentar isso ainda mais.

_É disso que eu tenho medo, que o amor aumente. _Disse Anne angustiada.

_Calma amiga! _Disse Piedra. _Vai dar tudo certo.

_Espero que sim. Só não quero amar ele demais, tenho medo de mim. _Disse Anne.

_Espero que você não ame não é. Eu gosto muito do rafa. _Brincou Piedra.

_Tá gozadinha assim logo cedo da manhã? Imagina a noite. _Anne sorriu. _E falando em noite como vai ser a tua? Teu pai vem mesmo?

_Ele disse que desmarcou muitos compromisso pra vir pra cá hoje. _Disse Piedra. _Mas não sei não, ele é tão enrolado que eu duvido que ele apareça. Agora Anne me responda, quem é que trabalha na noite de natal tirando o Papai Noel?

_É verdade, ninguém. _Disse Anne. _Mas ele vai aparecer, você vai ver ele ainda hoje. Que hora ele disse que chegaria?

_Ele falou que lá pelas sete da noite. Mas eu duvido muito. _Disse Piedra. _Quando ele fala que vai chegar sete é por que vai chegar as nove.

As duas sorriram.

_É verdade! Mas tudo bem, eu já estou acostumada. Eu só não vou perdoar se ele não vier ou não me trouxer um presente. _Disse Piedra sorrindo.

_Ele te conhece bem, não faria essa loucura. _Disse Anne sorrindo.

_Ele sabe disso, mas esquece as vezes. _Disse Piedra brincando, mas falando a real verdade.

_Tudo bem Pi, a gente se vê mais tarde então. _Disse Anne no celular. _O presente do Rafa já está pronto, foi difícil organizar tudo a tempo viu! Mas no fim deu certo. Espero que ele goste.

_Ele vai adorar, mesmo que tu mate ele minutos depois, mas ele vai morrer feliz. _Disse Piedra gargalhando.

_Pára de me torrar! _Disse Anne sorrindo também da brincadeira da amiga. _Mas agora é serio Pi. Tu não contou pro João nem pra ninguém né?

_Imagina Anne? Lógico que não, tu é louca? _Disse Piedra. _Mantive segredo mortal, ninguém está sabendo de nada, vai ser surpresa total.

_Assim está melhor. _Disse Anne. _E você sabe o que ele via me dar de natal?

_Claro que eu não vou falar não é Anne! _Exclamou Piedra. _Eu sei, mas não vou te contar nem sob tortura.

_É bem justo. _Riu Anne.

_Então até mais Anne. _Se despediu Piedra. _Qualquer coisa tu me liga, se precisar de ajuda.

_Pode deixar Piedra, mas está tudo bem mesmo, obrigada. Eu vou precisar de muita ajuda pra outra coisa, mas isso infelizmente você não vai poder me ajudar e nem ninguém. Eu vou ter que me virar sozinha. _Disse Anne voltando a angústia.

_Anne não se preocupe com isso, você vai se sair muito bem. _Disse Piedra. _E cuidado viu amiga, o Rafael é quente. MUITO quente.

_Obrigada Piedra, agora eu estou mais relaxada. _Brincou Anne ainda mais aflita.

Piedra sorriu elo telefone em seguida se despediu novamente e desligou.

_Quem era Anne? _Perguntou Alice.

_Era a Piedra, aquela garota que mora aqui do lado. Eu amo ela. _Disse Anne com um grande sorriso no rosto.

_Ela vai vir aqui hoje para cear conosco? _Perguntou Alice.

_Não. O pai dela vai chegar hoje para passar o natal com ela o namorado e a mãe dela. Então vai ser uma coisa mais em família, sem amigos. _Disse Anne. _Tipo a nossa noite aqui hoje, só para os íntimos.

_Vai ser ótimo, estar com minha família toda aqui hoje unida. Eu adoro o natal e não poderia estar melhor. _Disse Alice.

_O Luis que não está gostando muito né Lice? _Perguntou Anne.

As duas estavam no quarto de Anne, enquanto Luis, Marceline estavam no quarto de Olivier conhecendo tudo e onde ele estava morando agora. Marceline estava em um dos quartos da casa especialmente reservado para ela e Alice e Luis estavam dormindo em um dos quartos de hóspedes.

A casa de Anne era bem grande. Comparada às outras casas da Rua Canela a dele era a maior de todas. Na casa de Anne não havia outros andares como na casa de João, na de Rafael ou na de Piedra. A mansão tinha 8 quartos, todos com suíte, 1 cozinha, 2 escritórios, 1 biblioteca, e mais um cômodo perto da varando dos fundos que o Olivier usa como atelier, 2 salas-de-estar, 1 sala de jantar, 1 sala multimídia, Uma área nos fundos para lazer, e por fim a característica da casa que fez Anne escolhe-la, a casa não tinha piscina.

_Você conhece ele né Marrie? Essa história de ele vir pra cá, tão longe de casa, no natal, longe da família dele, e ainda chega aqui e vê o Olivier namorando com outro garoto? _Disse Alice. _Ele não está muito feliz não. Mas eu já tive uma conversa com ele. Ele vai se comportar.

_Espero mesmo Lice. Eu tô cheia de briga. A vida aqui tem sido só isso. _Riu Anne. _Mas até hoje o Luis não acostumou com a idéia do filho dele ser gay? Não tem como lutar contra isso e nem há porque lutar.

_Não adianta avisar Anne. Lá me São Paulo eu já cansei de brigar, de falar, mas não adianta. _Disse Alice. _Assim que vocês vieram pra cá, ele queria de todo jeito vir atrás de vocês.

_Pra quê? _Perguntou Anne.

_Pra levar o Olivier de volta. _Disse Alice. _Ele não entendeu e não entende até hoje o filho dele ser gay.

_Impossível, ter alguém assim até hoje. _Disse Anne. _E olha que eu sou antiga heim, era pra eu ser avessa a essas modernidades.

_Mas isso não é modernidade, o homossexualismo existe a muito tempo, o que acontece hoje é que a uma aceitação maior disso. _Disse Alice.

_É isso que eu quis dizer, pombas! _Disse Anne. _Parece que você andou pesquisando sobre os gays heim irmã.

_Não andei pesquisando, porque não há o que pesquisar, eu só fiquei mais atenta ao assunto. Nunca discriminei, mas agora sabendo que o meu filho é gay, passei a ver com outros olhos, olhos internos. Entendo como deve ser e respeito o Olivier e quem mais que seja Homossexual. _Disse Alice.

_Mas e o Juca? _Perguntou Anne. _Eu percebi que você não gostou muito dele.

_Mas isso não tem haver com ele ser gay. Eu só fiquei assustada, por meu filho estar namorando. Mesmo que fosse uma garota, tanto faz. De um jeito ou de outro, é o primeiro relacionamento sério do meu filho, eu imaginava isso desde pequena com as nossas bonecas, queria conversar com meu filho sobre isso, dar conselhos, saber de tudo, como foi o primeiro beijo. Tudo. _Disse Alice. _Eu fiquei... Eu fiquei... Chocada! Quando o Oli chegou pra mim e falou que o Juca era o namorado dele, mas só isso. Eu não o conheci direito ainda, mas me pareceu bem.. Bem...

_Bem chato! _Completou Anne. _Ele não é nada mais daquilo que ele pareceu pra você. Ele é imaturo, idiota, agressivo, grosso, estúpido, não tem educação nenhuma e nem é muito bonito.

_A ele é bonitinho, vai? _Disse Alice sorrindo.

_Não é não. _Disse Anne sorrindo.

_Mas esse Juca é tão ruim assim? _perguntou Alice.

_Pior! _Afirmou Anne.

As duas sorriram.

_Mas não é caso pra rir Lice, depois, já que tu vai ficar aqui até o Reveillon, senta com o Oli e conversa direito com ele, pedi pra ele te falar sobre o Juca, ver o que ele sente mesmo, ai tu vai entender o porque da minha reação. _Disse Anne.

_E porque essa reação? _Perguntou Alice.

_Porque eu estou me vendo. _Disse Anne. _O Juca não vale muita coisa, assim como o Humberto e o Oli faz de tudo pra ficar com ele, como eu fiz.

_O Oli parecido com você é preocupante. _Disse Alice.

As duas sorriram de novo.

_Lembra aquele dia do choro do Oli lá em São Paulo? _Perguntou Anne.

_Lembro. _Disse Alice. _Esse dia eu não vou esquecer jamais.

_Pois então. _Começou Anne. _Aquele choro todo, aquele desespero, você imagina que foi por causa do quê? Foi por causa do Juca.

_Sério? _Se espantou Alice. _Mas porque, eles já estavam juntos lá em São Paulo?

_Estavam, claro que estavam. Você não percebeu que o Juca não tem sotaque do sul? _Perguntou Anne.

_Nem reparei. _Disse Alice sinceramente.

_Eles namoravam escondidos lá em São Paulo. _Disse Anne. _O choro todo foi porque o Juca ia vir morar aqui no sul e o Olivier ia ficar sem ele, sozinho lá em São Paulo.

_Não acredito? _Alice estava espantada. _Então é por isso que ele queria vir pra cá desesperadamente. Aquele escândalo todo. Não entendi direito, mas agora está explicado.

_É isso mesmo que você entendeu. _Disse Anne. _É preocupante, e depois que eu conheci o Juca fiquei mais preocupada ainda.

_Porque tu viu que não valia a pena todo esse esforço do Oli. _Disse Alice ainda boquiaberta.

_Exatamente. _Disse Anne. _Eu tentei ser séria e conversar com ele, mas não consigo, eu sou pior do que ele, e nem tenho moral pra falar de amor com ninguém. Não sirvo de exemplo.

_Obrigada mesmo assim Marrie! _Disse Alice agora preocupada. _eu vou conversar com ele depois. O Luis não pode nem sonhar em saber disso.

_Claro que não. _Disse Anne. _Ele já está enfrentando muita coisa, isso só iria atrapalhar a situação.

_O Luis está passando por cima de muita coisa, a cabeça dele está a mil. _Disse Alice. Eu sei que é feio ter preconceito ou descriminar alguém, principalmente um filho, mas cada um é cada um e sabe o que faz. E o Luis também nunca destratou ninguém, ele é tolerante. Nunca foi grosso, ou mal educado com ninguém. Ele guarda pra si. E agora no caso do Oli, eu sei que ele deve estar se sentindo muito mal. Ele não gosta de falar muito sobre isso, mas eu sei, eu percebo. Eu entendo meu marido.

_Hoje a noite tu vai ver o que eu estou falando. _Disse Anne. _Você vai ter tempo o bastante pra conhecer seu genro hoje.

_Mas então me conta tudo, detalhes. Quero saber do Rafael. _Disse Alice animada.

_Ninguém mais pergunta sobre o meu filho. _Disse Anne.

_O quê? _Perguntou Alice.

_Ninguém mais quer saber sobre o meu filho desaparecido. _Disse Anne. _Todo mundo quer saber do Rafael, da minha casa nova, da minha nova vida de qualquer coisa, menos do meu filho.

_Não entendi você agora minha irmã. _Disse Alice. _Porque você está tocando nesse assunto agora?

_Porque ninguém está tocando nesse assunto agora. _Disse Anne com uma repentina revolta.

_Calma Anne! _Disse Alice sabida. _Fica calma, eu só perguntei, porque ele é seu novo namorado, depois do Humberto.

_Eu sei Lice, eu não estou revoltada com você, eu estou revoltada com todo mundo. _Disse Anne.

_Como assim Anne, que loucura é essa, porque esse assunto repentino? _Perguntou Alice.

_Eu não sei Alice. _Disse Anne. _Eu não sei.

Anne começou a se emocionar do nada.

_Anne, calma! Não vai chorar, o que é isso? _Disse Alice se levantando de onde estava e indo abraçar a irmã.

_Anne, pára de chorar garota! O que é isso? Que bobeira, pára de chorar! _Disse Alice enquanto Anne encostava a cabeça em seu ombro e chorava.

As duas ficaram por um tempo abraçadas enquanto Alice afagava as costas da irmã.

_Anne, mas será possível? Sempre tem que ter alguém pra cuidar de você? _Disse Alice. _Não fica assim, tua irmã tá aqui agora, eu vou cuidar de você. O que é que foi? O que tá acontecendo aqui?

Anne parou de chorar, enxugou as lágrimas que escorriam em seu rosto, se controlou e levantou a cabeça para encarar tua irmã.

_Ninguém fez nada pra mim. _Disse Anne. _Eu não sei o eu aconteceu, só me deu vontade de chorar.

_Ai Anne, não acredito vai? _Disse Alice. _É só me ver que tu já começa a sofrer, a chorar?

_Mas não é só por isso também. _Disse Anne chorosa.

_Porque mais? _Disse Alice.

­_Eu não sei, eu não sei. _Disse Anne.

_Tu falou do teu filho e depois começou a chorar. _Disse Alice. _Foi por isso?

_Acho que sim. _Disse Anne.

_Me fala então, o que é que foi? _Disse Alice.

Alice sabia que Anne só estava de manhã, ela precisava da irmã. Precisava chorar, desabafar, se sentir protegida, amparada. Necessitava de um ombro pra chorar. E só Alice tinha esse ombro, por enquanto. É nele que Anne Marrie podia ser Anne Marrie, sem fingir, sem forçar o social pra ser educada ou amiga.

_Meu filho. _Começou Anne. _Eu vim pra cá pra procurar meu filho. E o que estou fazendo? Estou caçando namorar.

Anne começou a chorar novamente e voltou a cabeça para o ombro da irmã. Alice se pos a rir.

_Mas Anne meu amor, não precisa ficar assim. Não quer dizer que você está namorando, que você esqueceu do seu filho. _Disse Alice.

_Mas é verdade. Eu não me sinto eu. Eu não sou assim. Legal, divertida, alegre, não amando. _Disse Anne quando levantou a cabeça de novo pra falar, enquanto enxugava as lágrimas.

_Mas você não me disse que está gostando do Rafael? _Perguntou Alice alisando os cabelos de Anne.

_Eu amo o Rafael. _Disse Anne.

_E qual é o problema? _perguntou Alice sem entender.

_Esse é o problema Alice. _Disse Anne. _Eu estou amando o Rafael, e não estou amando meu filho. Eu nem sei quem é meu filho.

Alice sorriu de novo.

_Mas Anne, não tem nada de mal nisso, amar não é nada demais. Quando aparecer seu filho, você ama ele também. _Disse Alice.

_Eu não sou normal Alice, eu não sou normal. Eu não tenho amor assim pra todo mundo. _Disse Anne olhando para a irmã. _Se eu gastar meu amor todo no rafa o que não vai ser difícil, não vai sobrar amor pro meu filho quando ele aparecer.

_Anne não é assim, amor não gasta. _Disse Alice.

_Mas o meu não é renovável. _Disse Anne. _Eu tenho medo de quando meu filho aparecer eu amar o Rafa demais e eu não me importar com meu filho.

_Isso nunca vai acontecer, é seu filho, não tem como não amar. _Disse Alice.

_Alice, até parece que tu não me conhece. Quando eu amava o Humberto eu até pensei em não ter meu filho se isso fosse condição pra eu ficar com o Beto. E quando eu já estava grávida eu tinha medo de quando ele nascesse eu não amasse ele, porque eu só amava o Humberto. Por isso eu o matei pra ficar livre, pra ter oportunidade de amar outra pessoa, e desde quando ele morreu todo o meu amor passou pro Gerárd. Meu amor é quantitativo, quando eu digo todo, é porque é todo mesmo, literalmente. _Se explicou Anne.

_E o seu medo é de não amar o teu filho? De você ter que escolher entre o Rafael e o Gerárd? _Disse Alice.

_Não é só isso. _Lamuriou Anne.

_O quê mais Anne? _Alice virou os olhos na órbita

_Eu não sinto meu filho mais. _Disse Anne. _Antes eu sentia ele mais, uma energia, uma vibração boa, um positivismo. Eu tinha certeza que eu ia encontrar ele, agora eu não tenho mais.

_Mas Anne, não a nada a se fazer. _Disse Alice. _E pra falar a verdade, eu não tenho esperanças nenhuma de que seu filho reapareça.

_Eu sei. _Anne chorou.

_Não precisa chorar por causa disso. _Disse Alice.

_É porque eu nunca pensei que não ia achar ele. _Disse Anne enxugado as lágrimas novamente.

_Mas desde quando você veio pra cá, você está sentindo isso? _Perguntou Alice.

_Não, eu vim pra cá pensando que ia encontrar, era bem forte. _Disse Anne. _Agora não é mais. Eu te contei do Roger e do cara suspeito na prisão dele. Mas a Ju me falou pra não confiar, ela acha que ele roubou meu filho, e essa história toda é armação dele.

_Será? _Se questionou Alice.

_Eu acreditei nela. _Disse Anne. _Mas também não é assim. Eu sinto que ainda vou encontrar ele, mas está mais fraco meus instintos maternos. O Rafa me distraiu dos meus objetivos. E eu não gostei disso. Não dele, não tem nada haver com ele. Estou com raiva do que está acontecendo comigo. Estou deixando de ser. Porque novamente estou ficando doente de amor por um homem. E não quero que isso atrapalhe minha vida de novo. Como aconteceu da primeira vez.

_Não vai acontecer isso. _Disse Alice. _Mas eu conhecendo você sei que isso é possível se teu filho não aparecer tipo, amanhã.

_Eu sei disso. _Disse Anne. _não acho que o Rafa vá me prejudicar igual ao Humberto, eles são completamente diferentes, mas o que eu estou percebendo é que eu estou mudando novamente o meu jeito de ser por alguém. É a minha doença de novo, só que não existe injeção pra curar.

_A injeção é o gerárd. _Disse Alice.

_É. _Disse Anne. _Mas cadê ele?

_Não sei irmã. _Disse Alice sorrindo.

­_Eu estou mais sociável, tenho vários amigos, sou gentil, simpática, converso e até ao shopping eu já fui. _Disse Anne frustrada. _Eu vim pra cá com essa intenção, confesso, de ser normal, encontrar meu filho e continuar minha vida, sem amores absurdos de novo. Mas ai o amor apareceu, o Rafael. Seria difícil ser sociável, uma pessoa normal, mas por causa do Rafael, ficou bem mais fácil. Eu vejo que eu passei a fazer coisas por causa dele, e que envolviam ter os mesmos amigos dele, ir em festas, sair pro shopping, conversar na praça. E eu fiz isso tudo quase sem perceber por causa do Rafa, por que pra ficar com ele eu tive que fazer isso. Eu me tornei mais sociável por causa dele e não por força de vontade minha, entende?

_Entendo. _Disse Alice.

_E eu tô vendo que é por causa desse amor absurdo que eu tô sentindo de novo que eu deixei de procurar meu filho. _Disse Anne.

_Anne, não tem como você achar seu filho sozinha, é quase impossível. _Disse Alice.

_Mas o Roger estava me ajudando e eu escolhi recusar a ajuda dele sabe? Me dei ao luxo de recusar uma ajuda. Coisa que eu estava fazendo antes sozinha. Eu me arrependi agora, até antes sabe. Mas o meu namoro com o rafa me fez esquecer disso. _Disse Anne.

_Eu entendi, eu sempre te entendo Anne Marrie. _Disse Alice. _Faz o que teu coração pedir.

_Eu só faço o que meu coração quer. _Disse Anne rindo finalmente.

_Eu quis dizer, que se você quer voltar a ter ajuda do Roger pra procurar teu filho, então volta. Volta a procurar, liga pro Roger, faz o que eu for preciso pra ter o que você quer. Pensa que nada vai atrapalhar você, nem o Rafa. _Disse Alice. _O Rafa inclusive não pode ser culpado disso viu Anne, não fale nada com ele, se não ele vai ficar chateado.

_Claro que eu não vou falar nada Lice. _Disse Anne. _Ele já é todo cismado.

_Então. Me fala do Rafa. Me fale detalhes de tudo. Porque eu já vi que o moleque é lindo e que você está apaixonada. _Disse Alice. _O Humberto deve estar se contorcendo no caixão.

As duas riram.

A tarde chegou e as duas continuaram no quarto fofocando, se atualizando uma sobre a vida da outra. Alice estava com saudades da irmã, sem contar que Anne precisava daquele ombro, daquela irmã, a despedida seria dura dessa vez, porque agora elas tiveram noção de quanta falta uma fazia pra outra. A tarde se estendeu e as duas se juntaram a Luis, Marceline e Olivier para se aprontarem para a noite, Anne tinha contratado um buffet natalino e quando caiu a noite já estava tudo pronto em cima da mesa. O combinado foi que Rafael fosse para a ceia na casa de Anne e depois da meia noite Anne iria para a casa de Rafael para ser apresentada oficialmente para a família do rapaz.

Piedra estava linda quando atendeu a porta e não ficou surpresa ao encarar teu pai. Ele não estava muito contente e não esboçava nenhuma felicidade no rosto ao ver a filha. _Mãe o pai já chegou! _Gritou Piedra

Eles se cumprimentaram.

_Credo pai! Que cara é essa? _Perguntou Piedra insegura com a reação do pai.

_Eu, tu e tua mãe precisamos conversar. _Disse Ralf.

Anne passava pela porta enquanto ia para o quarto se trocar para ceia.

Toc, toc, toc!

Anne parou no caminho e atendeu a porta.

_Pode deixar que eu atendo. _Gritou Anne.

_Anne, você precisa de uma empregada aqui nessa casa. _Disse Alice sentada no sofá.

Juliana estava com o semblante idêntico ao de Ralf, pai de Piedra, quando Anne a encarou sorridente.

_Hei Ju entra, que surpresa! _Disse Anne. _Agora que você tá aqui vai ter que ficar para o natal.

_Eu não vim pro natal. _Disse Juliana séria. _Eu vim pra conversar com você e é muito sério.

_Claro Ju, entra! _Disse Anne deixando a amiga entrar.

Juliana caminhou passo a passo para dentro da mansão DeVille.

_Você tá séria. Qual é o assunto? _Perguntou Anne quando reparou na inexpressão da amiga.

_Eu sei de tudo Anne Marrie. _Disse Juliana.

A porta dos desesperados.

Tenho a impressão de que Piedra e Anne Marrie vão se arrepender amargamente de ter aberto as suas portas.

Noite Feliz?