_Como pode ser assim?
Fingirmos mais do que o real
Sabendo que o inevitável,
era mais do que provável.
Como o preto e o branco,
seguiram juntos como nós?
sabendo que no final
tudo era bem mais colorido.
Minha cor, meu desejo
Não temos culpa se o lápis no papel nenhuma cor deixava
Uh, Tudo branco,
Como o nada é.
E como se nada tivesse muita importância,
de nós dois o que era cor,
não passou de um mero filme Preto e branco.
Quadros que pintamos
Tintas que gastamos, pra no final
Virar parte da parede da minha casa.
Vermelho nos amamos,
Azul e verde, nada é igual.
Nós dois não somos cores,
Somos só preto e branco.
A banda Moroles era composta por quatro garotas e um garoto. Ele era o vocalista, enquanto elas se dividiam entre os instrumentos. O som deles era contagiante, alegre e agradável aos ouvidos, as letras sempre remetiam ao amor, aos amores. Anne já era fã, desde que os ouviu naquela noite. Uma mistura de blues com rock, dava o tom da banda, que tinha um estilo próprio, independente e sem medo. A banda estava prestes a gravar o primeiro CD, e para se divulgarem pediram para Lourdes um espaço na cerimônia do concurso. Espaço concedido? Eles deram um show.
Os 7 pulavam e tentavam acompanhar aos berros os versos da música. Riam, dançavam, rodavam, gritavam, saltavam, cantavam.
_Obrigado, obrigado pessoal. _Começou a dizer o Vocalista ofegante, quando a música acabou. _Essa música se chama “Preto e Branco” e vai estar no nosso primeiro CD, que ainda sai esse ano.
As palmas subiram no ar.
_Essa música fala de amor, de como ele pode ser confuso as vezes. Quando a gente acha muito, a dura verdade é que não existe nada. _Disse a Guitarrista.
_Amor dói quando termina, machuca. Mas quando a gente ama de novo, esquece tudo que passou, tudo que sofreu, acredita no impossível, faz milagres. _Disse a Percussionista.
_O amor é a esperança pintada de vermelho, porque quando ele chega a gente acha que é o certo, o ideal. _Disse a Saxofonista. _Mas nem sempre isso é verdade. Mas mesmo assim a gente corre em busca de outro, na esperança de que seja o próximo.
_O amor é mal, o amor é bom. Não tem como descrever, a gente só tem que sentir. Mal ou ruim, é a coisa mais linda que existe. Amar. _Disse a Baixista, dando introdução a outra música.
Seguida de um acorde de Sax.
A música fez todos pularem ainda mais, era alegre, divertida, como todas as músicas da banda.
_Tri legal o som das gurias. Tu não achou Juca? _Perguntou Olivier aos berros pra tentar saltar a voz por cima do som alto que a banda fazia no salão.
_Eu gostei mesmo foi do vocalista. Canta muito bem. _Disse Juca malicioso.
_Sei bem o que tu gostou nele. _Disse Olivier. E não foi a voz.
Juca só deu um sorriso de lado e voltou a curtir Moroles.
Olivier não ligou muito e seguiu Juca na curtição.
Anne e Rafael dançavam agarradinhos, e Anne sorria lindamente ao ouvir as letras das músicas que tanto lembravam o que ela sentia. AMOR.
_Porque tu tá tão feliz? _Perguntou Rafael.
_Essa noite está sendo muito especial pra mim. _Disse Anne sem tirar os olhos do palco. _Pra você não?
_Bá! Mas é claro que sim. _Disse Rafael sorrindo. _É o melhor natal que eu vou passar na minha vida.
_Jura? _Sorriu mais Anne Marrie, virando de frente para Rafael. _Mesmo com uma assassina como namorada?
_Mesmo com uma assassina como namorada. _Disse Rafael. _É até excitante sabia?
Rafael subiu a mão pelas costas de Anne e a puxou pra perto, num abraço esmagador e erótico. De um molhado beijo na boca Rafael desceu seus lábios direto pro pescoço de Anne.
Anne se assustou com as novas intenções de Rafael e o empurrou automaticamente.
_O que foi? _Perguntou Rafael assustado.
_Nada. Não foi nada. _Disse Anne, assustada tanto quanto Rafael com sua reação. _Eu só me assustei, só isso.
_Com o que? _Questionou Rafael.
_Com você. _Disse Anne sinceramente.
_Porque? _Perguntou Rafael.
_Você nunca tinha feito isso. _Disse Anne envergonhada. _Nunca tinha me beijado desse jeito.
_Fiz algo de errado? _Se preocupou Rafael.
_Não Rafa, claro que não. _Disse Anne. _O problema é comigo mesma. A muito tempo que eu não faço essas coisas.
_Que coisas? _Perguntou Rafael.
_Ah, Rafael você sabe. _Disse Anne. _Essa coisa de namorar, beijar, e dar uns amassos.
_Dar uns amassos? _Disse Rafael, com uma cara de deboche. _Tu é nova demais pra ter tua idade, mas quando fala assim é que eu tenho certeza de que não é mentira.
Ele riu.
_Pára de rir! _Pediu Anne rindo dando um tapa no braço de Rafael. _Mas é verdade, esse tempo que fiquei afastada, não fiquei com ninguém. Eu só namorei um homem na vida. O Humberto.
_Eu sei de tudo Anne. Eu sei disso também. _Disse Rafael. _Mas eu não estou cobrando nada, mas uma hora ou outra isso vai ter que acontecer.
_ISSO quer dizer AQUILO? _Perguntou Anne sem graça.
Rafael riu e balançou a cabeça confirmando.
_Não tem graça! _Disse Anne. _Você ri, porque não é com você.
_Não se preocupe com isso agora Anne, eu estou tranqüilo. _Disse Rafael. _Quando acontecer, aconteceu, fácil assim, natural. Sem cobranças. Eu imagino o quanto deve estar sendo difícil pra ti.
_É e não é. _Disse Anne. _Eu já pensei nisso várias vezes, mas eu tento não ficar imaginando, se não fico sofrendo por antecedência.
_Relaxa. _Disse Rafael sorrindo. _Relaxa!
Os dois riram. E em seguida ainda sorrindo Anne se aproximou de Rafael novamente ao som de Moroles.
_Eu não vou te cobrar nada, quando tu tiver preparada, eu vou saber. _Disse Rafael.
_Será? _Brincou Anne.
_E desculpa por mais cedo. _Começou Rafael no ouvido de Anne pra que ela ouvisse. _Eu disse uma coisa que não deveria dizer.
_Tudo bem Rafa, eu nem lembro mais. _Disse Anne. _Eu também não fui compreensível. Eu sei que você tem problemas com sua família, e pensei só em mim.
_Não foi isso. _Disse Rafael. _Tu estava certa. Tu é minha namorada e pronto, eu te escolhi pra te amar. Minha família que se dane. Se pra ti é importante, é importante pra mim também.
_Não precisa, se você achar melhor. _Disse Anne. _Tem certeza?
_Anne, tu é minha namorada. _Disse Rafael. _Feliz tu, feliz eu.
Os dois sorriram e se beijaram.
Piedra, João e Patrícia se divertiam também.
O show seguiu com mais três músicas, que também falavam de amor. Sempre. O show terminou e a banda deixou o palco por baixo de aplausos e gritos de bis. Mesmo com o palco vazio a ovação não cessava, somente quando Lourdes subiu ao palco as palmas pararam.
_Podem continuar, eu também quero. _Disse Lourdes.
Tidos riram e bateram palmas novamente.
_Gracias. _Disse Lourdes sorrindo. _Essa foi la banda Moroles. Muito boa não?
Todos levantaram as palmas novamente.
_Agora é chegada a hora, mis amigos. _Disse Lourdes. _Chamo ao palco agora pra fazer o anúncio do grande vencedor. Minha querida filha Piedra Schreisen.
_VAI LÁ PI! _Gritou Rafael, puxando as palmas pra garota subir ao palco.
Piedra foi linda e morena desfilando até o palco. As mãos pararam de bater e a festa voltou a prestar atenção em Piedra.
_Boa noite, só eu de novo. _Piedra arrancou risadas de alguns. _Acho que isso é bom.
Anne e sua turma gargalharam. Piedra sempre teve aquele jeito prepotente, mas não precisava fazer isso na frente de uma platéia. Mas era engraçado para eles.
_A noite foi linda, e já está perto do fim, infelizmente. _Começou Piedra. _Mas pra terminar as premiações e atrações dessa noite, nada melhor do que com um vencedor, não é mesmo? O vencedor dessa noite levara o titulo de melhor decoração natalina do ano, representado por um troféu maravilhoso, um premio em dinheiro de cinco mil reais e um esportivo japonês.
Todos vibraram em palmas.
_Quer coisa melhor? Impossível não é? _Disse Piedra. _Pronto mãe, agora me dê logo esse envelope, porque eu não agüento mais de tanta curiosidade.
Todos riram enquanto Lourdes avançou até a filha e lhe entregou um envelope dourado envolvido por uma fita vermelha.
_E o vencedor do concurso de dec... _Começou Piedra ao desfazer o laço. _...Ah, cansei de dizer o nome desse concurso, é muito grande. Todos nós sabemos o nome não é mesmo, não preciso repetir.
Todos riram.
Por fim Piedra puxou o papelzinho de dentro do envelope e fez uma cara de surpresa. Seus olhos brilharam com as lágrimas que começavam a surgir devagar.
_E o vencedor do concurso é? _Disse Piedra tentando segurar suas emoções. _Olivier DeVille.
Piedra começou a chorar, entregou o envelope para mãe, desceu do palco o mais depressa que pode e correu para o banheiro feminino. João percebeu a decepção da namorada com o resultado e correu atrás dela. Olivier se surpreendeu com o resultado, ele achava que o ganhador seria o dono de uma decoração mais tradicional, mas comum, não original quanto a dele. Alice se levantou tão empolgada, tão feliz, que as palmas da suas mãos chegavam a arder de tão forte que batiam uma na outra. Luis não chegou a levantar, mas também estava feliz pelo filho. Olivier passou pela mesa dos pais, os abraçou bem forte e chamou Marceline junto ao seu lado. A caminho do palco Juca foi ao teu lado sem contato físico, apesar do escancarado orgulho do “primo”. Anne e Rafael o acompanharam também e os dois igualmente orgulhosos. Olivier parou diante das escadas do palco e apertou ardorosamente a mão de Juca, até que por fim Juca não resistiu e o abraçou por um tempo consideravelmente, carinhoso demais, para dois primos distantes. Por fim os dois se soltaram e Olivier subiu ao palco de mãos dadas com Marceline que estampava um grande sorriso no rosto, se sentindo por subir ao palco com o irmão campeão.
Olivier pegou o microfone das mãos de Lourdes tremendo, além de ele estar surpreso e chocado por ter ganhado o prêmio, ele, como sua tia, não se dava bem com o palco, com público, com pessoas. Um turbilhão de coisas pra dizer passava por sua cabeça nesse momento. Ele sentia um frio na barriga comparável apenas a um bom passeio de montanha-russa.
_É... Eu não sei o que dizer. _Disse Olivier vermelho de vergonha, tanto que seus olhos chegavam a estar molhados, como se seu rosto estivesse queimando. _Eu só tenho a agradecer, só agradecer, só isso. Obrigado.
Todos bateram mais palmas, Lourdes vinha logo atrás de Olivier com um pequeno troféu. Era um pequeno moinho de acrílico. As palmas, gritos e assobios aumentaram quando Olivier segurou o troféu e levantou para o alto. Antes que ele percebesse Marceline já estava com o microfone na mão.
_Oi gente. Meu irmão tem muita vergonha, mas eu vou falar por ele. _Disse Marceline sorrindo, fazendo todos sorrirem. _Eu, minha mãe e meu pai viemos só pra ver ele ganhar. Eu sabia que ele ia ganhar, ele é artista. Ele é pintor.
Todos sorriram.
_É verdade, ele até pintou minha tia Anne. Ficou mias lindo do que todos os quadros do mundo, por que a minha tia é linda, a mais linda de todas. Até mais linda do que a minha mãe.
_Chega Marceline. _Disse Olivier pegando o microfone da mão da garota.
_TE AMO MÃE. _Gritou Marceline, que foi ouvida mesmo sem microfone.
Todos bateram palmas enquanto os três sorriam e deixavam o palco.
A turma estava toda em frente ao palco para dar os parabéns de Olivier enquanto no telão um slideshow das fotos da decoração vencedora era exibido.
_Parabéns Oli. _Disse Rafael cumprimentando Olivier.
_Você merece Oli. _Disse Anne ao fazer o mesmo com o sobrinho.
Quando chegou a vez de Patrícia ela pulou no pescoço de Olivier e abraçou o mais forte que pode.
_Obrigado Pati, mas tu tá me enforcando. _Disse Olivier sorrindo feliz da vida com o troféu na mão.
_Desculpa. _Disse Patrícia quando soltou o amado. _Eu só queria te dar os parabéns, a tua decoração era com certeza a melhor de todas, não tinha pra ninguém.
_Tudo bem. _Disse Olivier em meio a tanto parabéns.
Alice e Luis vinham se aproximando pra cumprimentar o filho.
_Espero que teu primo não fique bravo. _Disse Patrícia.
_Que primo? Nós não temos primo. _Disse Marceline.
_O quê? _Perguntou Patrícia sem entender.
Alice chegou abraçando forte o filho.
_Parabéns filho! _Disse Luis sorridente, antes de começar a conversar com um senhor da mesa de trás.
_Parabéns, meu lindo. Você merece tudo de bom querido, parabéns. _Disse Alice emocionada.
_Mãe, não precisa chorar. _Dizia Olivier sorrindo.
Alice fez bem em ter chegado nessa hora, por Olivier ela podia ficar ali abraçada com ele pelo resto da festa. Patrícia parecia estar confusa com a revelação de Marceline e ela queria explicações, ela queria a verdade.
_Eu estou feliz, só isso filho. Não posso? _Disse Alice quando soltou o garoto.
_Tudo bem. _Disse Olivier. _Cadê o Juca?
_Não sei Oli, mas eu vi ele saindo de perto da gente. _Disse Anne.
_Eu também vi o primo de vocês saindo daqui parecia que ele foi no banheiro, tava com uma pressa. _Disse Patrícia.
_Que primo? _Disse Anne, sem pensar.
_Como assim, que primo? _Disse Rafael. _O seu primo Anne.
_Que primo? _Perguntou Alice. _A Anne não tem primo.
_Espera ai. _Disse Patrícia. _O teu primo Olivier, não é primo da Anne também?
_É claro que sim! _Disse Olivier nervoso.
_É claro que não! _Revidou Alice. _Nossa família, não é grande para termos primo, papai é filho único, eu e Anne não temos tios, muito menos primos.
_Não entendi. _Disse Rafael.
_Eu menos. _Disse Patrícia. _Oli, quer explicar essa história direito?
_EU? _Assustou Olivier.
Juca se aproximou e sem querer ajudou Olivier.
_Ela está aqui Olivier. _Disse Juca alterado.
_Quem está aqui? _Perguntou Olivier aliviado pela mudança de assunto.
_Aquela menina que a Piedra bateu mais cedo. _Disse Juca. _Luisa não é?
_A Louísa. _Disse Olivier.
_Eu não acredito que ela voltou. _Disse Rafael.
_Quando você estava lá em cima eu vi ela no meio da multidão. _Disse Juca. _Dai eu corri até lá pra perguntar o que ela estava fazendo aqui.
_E ai? _Perguntou Patrícia.
_E ai, que ela disse que a festa pra ela ainda não acabou. _Disse Juca.
_Ela vai aprontar de novo. _Disse Rafael revoltado.
_E cadê a Piedra? _Disse Anne. _A Louísa vai atrás dela.
_Eu vou procurar por eles. _Disse Patrícia que se pos a correr em direção aos camarins.
_Vamos atrás dela também. _Disse Rafael.
_O que está acontecendo gente, o que essa menina fez? _Perguntou Alice.
_Mãe, só imagina alguém tão louca quanto a tia! Imaginou? _Disse Olivier. _Agora duplica isso! Essa é a Louísa.
_Meu Deus! _Alice se chocou.
_Credo Alice, eu não sou tão louca assim. _Disse Anne.
_Depois eu te conto mãe o que essa Louísa já fez. _Disse Olivier.
_Pra onde ela foi Juca? Tu que estava com ela agora. _Disse Rafael.
_Eu a perdi de vista. _Disse Juca. _Quando a entrega de prêmios acabou todos levantaram pra aplaudir o Olivier e eu me atrapalhei, e ela aproveitou pra fugir.
_Droga! _Disse Olivier. _Vamos.
_Então ele que é meu primo? _Perguntou Alice.
_Prazer. _Disse Juca sorrindo.
_Então vamos. _Disse Rafael. _Fica ai Anne, e cuidado.
Rafael, Olivier e Juca saíram em disparada em busca de Louísa.
_Anne Marrie DeVille, eu quero saber que história é essa de primo. _Disse Alice, sentando Anne no primeiro lugar vazio que viu.
_Eu vou te explicar. _Disse Anne. _Mas promete que não vai brigar heim.
_Mesmo se eu não prometesse. Eu não consigo brigar com você. _Disse Alice. _Agora me conta direitinho quem inventou essa história de Primo de Anne Marrie, e pra quê minha irmã?
Luis continuava a conversa com o senhor da mesa de trás, eles pareciam falar de algo relativo à bolsa de valores e a crise. Marceline ficou sem lugar e foi buscar algo para beber quando percebeu que o papo ia ficar sério. Ela não gostava muito de ouvir essas coisas, ela se sentia velha.
Louísa subiu ao palco, calmamente, sem chamar a atenção de ninguém, ela estava com um leve vestido branco que mais parecia uma camisola. O vestido era de seda e tinha algumas rendas dando a veste uma cara mais sofisticada, que não a deixava simples demais pra ser um pijama. A garota segurava nos braços um grande buquê de rosas vermelhas e perfumadas. Quando ela segurou o microfone a freqüência alta chamou a atenção de todos que olharam imediatamente para o palco.
_Eu gostaria de pedir a atenção de todos. _Começou a garota.
Rafael, Olivier e Juca olharam na mesma hora e ficaram paralisados diante do perigo eminente que era Louísa no microfone.
_Em homenagem ao brilhante artista vencedor do concurso desse ano, eu estou aqui hoje. _Disse Louísa sorridente. O rosto branco de pó, na tentativa de esconder os hematomas e arranhões no rosto, não funcionou muito. A garota estava estranha, doente, visivelmente perturbada, os olhos esbugalhados e vermelhos de tanto chorar, os cabelos mal arrumados para trás num coque mal feito, no nariz quebrado uma grande bandagem. A imagem deprimente de alguém moribundo e infeliz, ou seja, um morto-vivo. Um zumbi. _Ele mesmo me pediu para subir aqui no palco hoje e oferecer essas flores, essas lindas rosas, a pessoa que ela mais ama. E que está aqui neste salão hoje.
Ninguém se manifestou. O coração de Olivier saltou acelerado debaixo da costela e ele jurou que ouviu uma delas se partir, tamanha era a força que seu coração bateu. Juca foi mais racional, escutou calado, confiando que Louísa não tinha provas de que ela era o namorado de Olivier. Patrícia, Piedra e João vinham se aproximando bem nessa hora, saídos dos camarins.
_Vamos gente! Cadê as palmas? _Perguntou Louísa erguendo o buquê. Alguns bateram palmas sem entender, mas mesmo assim foram poucas. _Vermelho como o amor, essa rosas representam esse sentimento tão bonito, que tanto buscam, que tanto querem saber o significado. Lindo não?
_O que essa guria está aprontando agora? _Perguntou Piedra.
_Não sei Piedra, mas é melhor tu avisar tua mãe. _Disse João.
_Não precisa, ela sabe que essa guria pode acabar com a festa dela. _Disse Piedra. _Ela já deve estar tomando alguma providência, não é possível.
_Tomara né Pi. _Disse Patrícia com medo de Louísa.
_Esses dois vem se gostando a muito tempo, mas em segredo. _Recomeçou Louísa. _Não entendo, porque algo tão bonito, tão legal, pra esconder.
_Olivier, faz alguma coisa! _Disse Juca. _Se ela falar da gente, vai acabar tudo.
_O que? Acabar o que? _Perguntou Rafael. _Vocês sabem do que ela está falando?
_Calma Juca, não tem como ela saber de nada. _Disse Olivier. _A não ser que tu contou alguma coisa.
_Eu não. _Disse Juca automaticamente. _Quer dizer...
_Tu disse? _Tremeu Olivier.
_NÃO. _Disse Juca. _Não sei.
_Ai meu Deus! _Disse Olivier. _Meus pais estão aqui Juca, e agora?
_Eu não estou entendendo nada. _Disse Rafael.
_Espero que ninguém esteja cara. _Disse Juca.
_Chegou a hora de revelar o mistério, o próprio Olivier não quer mais esconder isso. _Disse Louísa sorrindo com dificuldades devido à dor que sentia no rosto. _Patrícia querida, suba aqui no palco e receba essas lindas rosas que seu amado Olivier lhe deu.
Luis abriu um sorriso.
Os pés de Patrícia saíram do chão, flutuaram num clarão, e devagar as cores de outras lembranças entraram veloz em sua mente, pensando em outras coisas, como se um filme estivesse sendo rebobinado na sua cabeça. Flores, bombons, cartas, buquês, perfumes, mensagens, declarações, quadro. Em um segundo ela estava de volta para a festa, tonta com tão rápida viagem e com tal absoluta certeza da verdade. Como doeu, como era triste saber enfim a verdade.
_Cadê a felizarda? _Disse Louísa. _Vamos Patrícia, cadê tu? Vai desperdiçar um buquê lindo desses? Tem gente que não se daria a esse luxo heim. E eu te conheço, sei bem que tu quer vir aqui pegar essas flores e colocar com aquelas outras flores mortas na sua casa, aquelas que tu já ganhou antes. Ou então junto com aquela flor seca. Aquela primeira que tu ganhou do Olivier, aquela que tu guarda no teu diário heim, na seção EU AMO O OLIVIER. Deixa de ser boba Pati, sobe aqui logo. Cadê tu?
Patrícia não suportaria enfrentar Louísa agora, não ali, não tão fraca como ela estava. Fugiu-lhe o coração, lhe fugiriam as palavras. A garota correu em direção a saída aos prantos. Piedra viu tudo, mas achou melhor não segui-la, ela sabia o que deveria ser feito. Louísa estava pedindo pra apanhar mais, e Piedra iria atender os pedidos da guria.
_Nem pense nisso Piedra. Isso agora não vai adiantar. _Disse João sério segurando o braço da namorada.
_Ela tinha que se vingar de mim, não da pobre da Pati. _Disse Piedra.
_Isso não tem nada haver contigo, a muito tempo que minha irmã vem recebendo essas rosas, achando que eram do Olivier, eu nunca disse nada porque não queria deixar o guri com vergonha. _Disse João.
_Eu vou chamar minha mãe agora! _Disse Piedra. _Cadê os seguranças dessa festa que até agora não tiraram essa garota de lá?
_Eu vou atrás da Pati, ver se ela está bem. _Disse João.
_Ela já saiu, vá com ela até em casa e vê se tenta acalma-la. _Disse Piedra. _Eu vou pra tua casa assim que colocar essa louca pra fora.
_Sem bater Pi. _Disse João.
_Pode deixar. _Disse Piedra dando um beijo no namorado.
_Foi embora? Ah que pena. _Disse Louísa fazendo beicinho. _Agora quem vai ficar com as rosas? Ninguém? Ninguém?
Lourdes vinha da portaria com cinco seguranças. Os seis marchavam por entre as pessoas abrindo caminho entre os convidados. Piedra encontrou com a mãe no meio do caminho e se juntou a tropa.
_Sabe o que é mais engraçado? _Perguntou Louísa no microfone. _É o porque Olivier ama tanto a Patrícia desse jeito? Não. Porque pelo o que eu sei os gays gostam de pessoas do mesmo sexo não é? O que define eles como homossexuais. Não é verdade? E disso eu tenho certeza, porque ele mesmo me disse. Não é Oli?
Alguns se chocaram, outros nem tanto. Olivier ficou assustado porque lembrou que era verdade o que Louísa falou, ele mesmo contou a ela sobre sua sexualidade, ingênuo na época não sabia que isso podia ser usado num discurso para o Moinho inteiro.
_Então sendo assim, o buquê fica pra quem vir pegar aqui primeiro. Ou a Patrícia se entrega a essa paixão louca, que nem eu mesmo entendo. Ou então o Juca, o primo bastardo que apareceu do nada. Isso mesmo Juca, pode vir aqui pegar também, mas só me responda uma coisa antes, tu é o passivo ou o ativo?
_DESCE JÁ DAÍ LOUÍSA! _Gritou Theodor no meio da multidão.
Louísa tremeu ao ouvir a voz do pai, ela tinha receio ao que ele poderia fazer.
_Eu ainda não acabei. _Disse Louísa segurando o microfone com força.
_EU NÃO ESTOU BRINCANDO! _Gritou Theodor novamente.
_Pois eu estou. _Disse Louísa no microfone. _Quem quer brincar mais?
A festa estava parada, todos os convidados congelaram em seus lugares e alguns copos pararam a meio centímetro da boca, os garfos erguidos no ar, garçons equilibrando pilhas de taças de champanhe, Louísa, Piedra e os seguranças também pararam no caminho ao palco, Anne parecia normal, serena e observadora ao lado de Alice, que fitava a toda hora a reação de Luis, às palavras de Louísa. O silencio era perturbador. Só o som da voz de trovão de Theodor e da fina voz de Louísa tomava conta do lugar.
_ACABOU TUDO LOUÍSA, SUAS BRINCADEIRAS, SUAS LOUCURAS, SUAS VINGANÇAS, ACABOU! _Disse Theodor duro de raiva.
_Mas querido paizin... _Começou Louísa.
_EU NÃO QUERO MAIS OUVIR A TUA VOZ, TER QUE OLHAR NA TUA CARA, TU ESTÁ COMPLETAMENTE FORA DE SI, FORA DA REALIDADE. VIVE NESSE MUNDINHO DOENTE QUE TU CRIOU NA TUA CABEÇA. _Disse Theodor. _TU VAI DEIXAR ESSES LUGAR EM PAZ, E ACEITAR QUE TU NÃO TEM NINGUÉM. MAS NÃO TEM NINGUÉM MESMO, NEM A MIM, NEM A TUA MÃE, NINGUÉM. TÁ SOZINHA COMO SEMPRE QUIS.
_Eu nunca vou ficar sozinha, minha mãe está comigo. _Disse Louísa pelo microfone.
_ATÉ A TUA MÃE DESISTIU DE TI LOUÍSA. ELA ME MANDOU AQUI ATRÁS DE TU, PRA TI MANDAR PRA LONGE, PRA UM MANICÔMIO, PORQUE NEM ELA TE AGÜENTA MAIS. _Disse Theodor.
_É mentira tua. _Disse Louísa começando a se abalar. _É MENTIRA!
Louísa jogou o buquê no chão com força e saiu correndo do palco envergonhada. Theodor contornou o palco depressa. Os seguranças de Lourdes já estavam esperando a menina quando ela tentou passar por eles correndo e chorando. Eles a seguraram com facilidade com uma só das mãos e nem foi preciso cinco seguranças, dois apenas foi o suficiente. Louísa começou a gritar e a se debater contra os fortes homens. Theodor então chegou também aos prantos diante dos gritos da filha que cortavam seu coração de pai. OS gritos eram feios, finos e tristes. Gemidos de dor soavam por todo o lugar, dor na alma, dor interior, não podia ser comparada a simples arranhões e ossos quebrados, a dor de Louísa era interior.
_Cuidado, não machuquem ela. _Pedia Theodor aos seguranças.
_A gente vai ter que tirar ela daqui Senhor Zurück. _Disse Lourdes.
_Meu carro está ai na porta. _Disse Theodor cansado daquilo tudo.
_Tudo bem, eles vão leva-la até lá, não se preocupe. _Disse Lourdes. _Ninguém vai machucá-la.
_Obrigado. _Disse Theodor.
Eles seguiram para a saída enquanto todos calados olhavam boquiabertos a situação.
João que não viu a discussão de pai e filha estava do lado de fora a procura de sua irmã. Os paparazzis e fotógrafos não perceberam sua saída e por isso permaneciam quietos, sentados em seus carros e espalhados no meio fio. João viu Patrícia de costas e logo correu em direção a ela que estava do outro lado da rua. Ao se aproximar mais, percebeu que havia um homem ao lado da irmã.
_Patrícia! _Gritou João.
Patrícia entrou na porta de trás de um carro preto de luxo, e o homem seguiu para o lugar do motorista, ao se virar João reconheceu o rosto não do homem, mas do garoto que acompanhava sua irmã. André entrou no carro feliz, como se carregasse no banco de trás um troféu. João correu, gritando ao berros o nome da irmã. André abaixou um pouco o vidro e sorriu para João, provocando o garoto ainda mais.
_Pára esse carro André! _Disse João ao se aproximar da janela do motorista. _Desce do carro Pati!
O carro cantou os pneus e deixou uma marca no asfalto. Com o barulho, os antes distraídos fotógrafos e repórteres, acordaram e se puseram a tirar fotos. João viu a irmã ser levada pelo jovem traficante no grande carro preto de luxo e em seguida vários flashes invadiram sua visão, e ele não pode ver a direção que o veiculo tomou. Quando os flashes diminuíram o carro havia sumido no ar. João tampou o rosto com as mãos tentando se esquivar da fotos e para melhorar a vista olhou para o outro lado e pode ver o grande moinho no centro da praça. O velho monumento estava com as pás girando levemente com o vento. A noite ainda continuava calma, climaticamente falando.